...
Sinto tantas vezes que não marcho ao mesmo ritmo
E não marcho na mesma direção que o resto das tropas
Como um desalinhado...

João Miguel, O Pássaro do Sul

09/07/2011

Sobre o mote infidelidade...



Anaïs Nin by Irving Penn


«O verdadeiro infiel é aquele que só faz amor com uma fração de ti.
E nega o resto.»

Anaïs Nin (citação trazida a meus olhos através das mãos que amo, tu Katyuscia)


Tanta substancia em poucas palavras, um retrato da esmagadora maioria dos "amores" que se vivem hoje em dia.
Ama-se o aspecto, o status, mas não se amam os problemas, nem se luta por viver o amor por completo em conjunto.
Ama-se o prazer e a sintonia física, mas recusa-se a luta do dia a dia, ama-se à noite e esquece-se de dia.

O retrato do desfasamento que hoje em dia acontece em relação ao que faz a grande diferença entre amor e amizade, o egoísmo. O meu amor, e a única visão de amor que tenho é egoísta, a que amo, quero-a comigo a toda a hora, a todo instante, quero cada lágrima e sorriso, cada dor e alegria, amo por completo com tudo que isso implique...
A Anais Nin é fabulosa, esta é com certeza a maior das infidelidades, pois que não se dá e não ama o outro completamente, mas sinto, nos dias que vivemos de conceitos e regras, de falsos moralismos e ética desvanecidas, que o mais comum é o estar com alguém pensando noutro...

Acho que há uma critica a fazer à sociedade que se quer ver ligada aos lugares da frente da globalização e que tenta tudo para o estar, pensando que países do pelotão da frente são assim, cria o amor das parcialidades, criam-se conceitos e mais conceitos, para dizer isto é mau e isto é bom e depois se marginalizar. Tudo está ligado, quem ama parcialmente, porque na maioria se ama assim hoje em dia, é vitima e carrasco, quem conceptualiza e diz isto é bom ou isto é mau, dá o direito a outros de o fazerem em relação a ele, se não for nesse campo, noutros. Amam-se "belezas" e não a beleza, amam-se conceitos e não os sentimentos, amam-se "purezas" e não a pureza, ama-se enquanto nos for agradável, beneficiar, der jeito, ama-se para matar o tédio, mas não se luta para acabar com a fonte de tédio, não se está quando os benefícios acabaram e o outro ama mesmo assim.
Em suma Amor, o que se usa e deita fora hoje em dia é uma parcialidade, é hedonismo, elitismo, mais que adorar, procurar ser adorado. Eu sou do outro...

Esta frase tem-me dado a volta ao juízo, a Anaïs Nin escreveu com coração sedento de amor, do AMOR, ela escreveu-o certamente por sentir que no que tocava às suas lutas diárias e às suas duvidas existenciais, se acobardavam. Eu agora depois de tanto reflectir à volta deste pensamento diria que é uma faceta sim, da maior infidelidade, porque quem ama só uma fracção e nega o resto, (será isso amor?) no fundo também só ama (continuo a pensar se se pode ou deve nomear assim?) com uma parte de si, só vive com parte de si, só sente com parte de si, é para mim um cobarde, é alguém infiel a si próprio, a maior infidelidade de todas...

Uma citação mais da Anaïs Nin a juntar às outras duas que são máximas para mim:


"A vida se contrai e se expande proporcionalmente à coragem do indivíduo."

"Não vemos as coisas como são: vemos as coisas como somos."


Anaïs Nin

Uma reflexão...


João Miguel, O Pássaro do Sul

1 comentário:

Branca disse...

João Miguel,

Como sempre uma análise deslumbrante a tua!
Já tinha lido esta citação no blog da Katyuscia, já voltei a lê-la ontem aqui, mas só hoje tive algum tempo para escrever. Pois é verdade, a fidelidade só existe com uma entrega inteira, com tudo o que faz parte de nós e do outro, poucos sabem o que é o Amor, por isso o mundo vive tão doente.

A esperança reside naqueles que se interrogam continuamente e se entregam de corpo e alma aos objectivos comuns, amando também o que de individual reside em cada um, amando tudo isso sem limites, numa entrega um ao outro e ao mundo.

Beijos
Branca